sexta-feira, 30 de abril de 2010

Ana, Emma e Capitu...alguma semelhança?

Ao ler o romance “Ana Karênina” de Leon Tolstoi, o leitor pode ter reações adversas. Pode sentir pena da pobre Ana que se perde na ânsia de um amor proibido e acaba com a própria vida procurando vingar-se do amante. Pode sentir repulsa por Ana, uma mulher adúltera que abandona o filho e o marido aristocrata para viver uma história desde o começo marcada pela tragédia. Pode sentir pena de Karenin o marido traído, ou achar que ele não amava Ana de verdade e não merecia o seu respeito e o seu amor. O leitor pode ter várias reações, depende dos seus conceitos e dos seus critérios ao avaliar a história construída por Tolstoi. Algo que o leitor não consegue, é não sentir nada e não se envolver com Ana Karenina. A intensidade dos sentimentos de Ana e os fatos que se desenvolvem durante a sua vida, são marcantes e não passam despercebidos, independente das nossas crenças e dos nossos valores.
Da mesma forma, ao ler “Madame Bovary” de Gustave Flaubert, o leitor pode acreditar que Emma é uma mulher fútil, filha de uma burguesia mais fútil ainda e que mereceu o trágico fim que teve e a morte dolorosa. Pode acreditar que Emma era apenas uma mulher vítima dos “romances açucarados” e da criação que teve e que tinha o direito de procurar satisfazer-se com seus amantes. O marido de Emma, Charles Bovary, é um personagem às vezes risível para o leitor e às vezes digno de pena. A filha Berta, tão vítima do egoísmo dos pais, é uma figura que quase passa despercebida, mas que também causa sentimentos de toda a espécie no leitor. Assim, quem lê o clássico francês não consegue ficar sem nenhuma reação diante de tantos fatos que envolvem valores tão discutidos na sociedade como adultério, consumismo e a família.
“Dom Casmurro” nunca passará despercebido em qualquer ocasião que seja lido ou discutido. Muitas vezes ele é reduzido a questão “Capitu traiu ou não traiu?” Não há como negar que Capitu é intrigante desde a sua apresentação feita pelo marido depois de muitos anos de separação, até os momentos cruciais como o velório de Escobar por exemplo. A narração é feita por Bentinho, fato que causa muitas dúvidas e questionamentos sobre a veracidade de tudo que ele conta. Um homem ciumento que acredita ter sido traído não é isento no que diz e exclui a opinião do outro lado da história: a mulher “adúltera” Capitu que tem como desfecho o exílio na Suíça.
Três romances que contam mais do que histórias de amor e adultério. Contam com personagens que nos fazem refletir e discutir e que trazem sentimentos impossíveis de serem negados. Ao comparar as diferenças e semelhanças entre eles, podemos entender melhor porque são atuais mesmo depois das mudanças que a sociedade sofreu desde que foram escritos e como continuam sendo lidos com o mesmo ardor de quando eram novidades realistas entre os folhetins românticos russos, franceses e brasileiros.
Três mulheres, três romances, três estórias, três sociedades diferentes...o que faz haver uma aproximação entre eles? Além do adultério comprovado em dois deles e suposto em um, temos três desfechos trágicos, duas mortes e um abandono. Mas, ainda não é isto que faz com que eles sejam aproximados.
Eles se aproximem pelo julgamento que cada sociedade diferente entre si fez destas mulheres que ousaram transpor os costumes da alta classe.
O Realismo vigente na época em que as três obras foram publicadas era diferente em cada sociedade. Na Rússia ele voltou-se para o cristianismo e a moral, enquanto na França foi totalmente objetivo e científico, no Brasil, procura denunciar a realidade e a podridão escondida nos pilares da sociedade, entre eles, a família.
Sendo assim, temos três personagens construídas através de um foco literário que leva o leitor a amá-las ou odiá-las, ou até mesmo apiedar-se delas. O que o leitor não consegue é ficar inerte a narrativa densa e bem construída de três autores que marcaram a literatura mundial.
Leon Tolstoi, não deixou de lado o realismo moralista russo na hora de compor o enredo de “Ana Karênina”, um romance cercado por conceitos da época que são observados através das atitudes da sociedade quanto ao adultério feminino e o masculino.
Gustave Flaubert por sua vez, inicia o realismo mundialmente com seu polêmico romance, que retrata as mazelas de uma sociedade de forma tão “realista” que foi até julgado por imoralidade...tão verossímil era sua Emma Bovary. No julgamento, ao responder “Madame Bovary sou eu”, ele quis dizer que Madame Bovary não era um caso isolado e sim, o retrato de uma sociedade inteira que se afastava cada vez mais dos ideais de “Igualdade, Liberdade e Fraternidade” pregados na Revolução Francesa e se aproximava do igual materialista e consumista pregado pela burguesia em ascensão.
Machado de Assis tem por mérito fazer com que a sociedade machista brasileira do século XIX duvidasse de um marido possivelmente traído e se sentisse atraído por uma mulher a frente do seu tempo, dissimulada e sedutora. Seu “Dom Casmurro” tornou-se imortal e é bem mais do que a simples questão: Traiu ou não traiu?
Três obras imortais que tratam de mulheres que amaram, viveram intensamente seus amores e pagaram um preço muito caro por isso.

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