domingo, 28 de novembro de 2010

Contos de amor rasgados - Marina Colasanti


Neste livro Marina Colasanti faz uma interessante incurssão pelo tema AMOR, aliando a inteligência se seus ensaios à criatividade ficicional que possui.
O livro possui uma feminilidade que extravasa as meras aparências do senso comum, apresentando minicontos, pequenas fábulas, ou mesmo poemas em prosa com os quais o leitor se identifica desde o início da leitura, seja ele homem ou mulher.
Percebemos as pequenas alegrias e tragédias que movem esta aventura incrível que é a vida e isso se dá através de enredos que vão além daquilo que podemos compreender.
O livro guarda em comum com as demais obras da escritora a comunicação direta e a linguagem emotiva, que faz com que o leitor encontre a poesia nas diversas situações narradas em cada linha escrita por Marina Colasanti.



Deixo aqui um dos meus minicontos preferidos:



Amor de longo alcance
Durante anos, separados pelo destino, amaram-se a distância. Sem que um soubesse o paradeiro do outro, procuravam-se através dos continentes, cruzavam pontes e oceanos, vasculhavam vielas, indagavam. Bússola da longa busca, levavam a lembrança de um rosto sempre mutante, em que o desejo, incessantemente, redesenhava.
Já quase nada havia em comum entre aqueles rostos e a realidade, quando enfim, numa praça se encontraram. Juntos, podiam agora viver a vida com que sempre haviam sonhado.
Porém cedo descobriram que a força do seu passado amor era insuperável. Depois de tantos anos de afastamento, não podiam viver senão separados, apaixonadamente desejando-se. E, entre risos e lágrimas, despediram-se, indo morar em cidades distantes.



É muito bela esta visão de que o amor basta por si próprio e não precisa estar perto da pessoa amada para continuar vivo. Mas então qual seria a razão da longa busca? Pode ser a emoção de viver a procura da emoção passada, das coisas boas vividas juntos, de um rosto sempre mutante que se redesenhava quando o tempo queria apagá-lo da memória. Como se fosse uma felicidade clandestina, os dois se procuram levando apenas as lembranças, nada de concreto. Quando se descobrem, percebem que a força do passado era insuperável e nada faria com que os belos tempos voltassem da forma como eram. Seria melhor então ir viver em cidades distantes. Desfecho triste? Depende da visão que o leitor tiver, pois os dois escolheram partir, já que não precisavam estar pertos, pois o amor era de longo alcance. Não é fácil entender esta escolha, parece improvável para uma sociedade objetiva como a nossa que alguém consiga viver sem uma presença física, sem ter a "coisa" amada por perto. Não foi fácil assim para os dois amantes, eles se despediram entre risos e lágrimas, mas perceberam que, no grande livro da vida, poderiam ler as melhores páginas unidos pelo sentimento, apenas isso bastaria.





sábado, 20 de novembro de 2010

Pai contra Mãe - Machado de Assis


Um pai e uma mãe. Dois dramas eminentes e uma única saída: ter compaixão ou cumprir um objetivo para seu próprio benefício. Cândido Neves, caçador de escrados fugitivos, precisa encontrar uma forma de permanecer com o filho, pois não tem dinheiro para manter o menino. Desesperado, sai com ele nos braços rumo a roda dos enjeitados. No caminho para o fatal destino, uma esperança começa a brilhar: uma escrava fugitiva poderia lhe trazer dinheiro suficiente para salvar o filho do abandono.
Ao deparar-se com a pobre escrava grávida implorando-lhe a compaixão, pois não quer ser cativa novamente e ver o filho ter o mesmo destino que a atormenta, Cândido Neves tem em sua frente um dilema muito íntimo, pois ele também é pai e, assim como aquela escrava, luta pelo filho. Na luta do pai branco contra a mãe negra o primeiro acaba vencendo e, quando a mãe aborta o bebê devido aos maltratos que recebera na captura e nos castigos, Cândido encontra uma forma típicamente machadiana de aliviar a consciência: "Nem todas as crianças vingam". Ora, o pequeno escravo poderia nascer morto de qualquer forma, ou morrer ainda bebê por consequência da situação precária na qual seria inserido.
Cândido precisa acreditar nesta "verdade" que encontrou, ele precisa voltar para a casa e viver em paz com o filho e a esposa. Nada mais conveniente.
Machado de Assis apresenta neste conto aspectos da miséria existente no Rio de Janeiro do período imperial, que contrapõe-se a riqueza e ostentação dos senhores de escravos. Logo no início, descreve formas de torturas utilizadas pelos escravocratas para manter os cativos submissos. Na descrição, nenhuma crítica clara, apenas a apresentação de objetos e situações que, por si próprios, chocam o leitor dos nossos tempos e o deixa consternado. E o leitor daquela época? Seria o filho do escravocrata leitor do conto "Pai contra Mãe"? E se fosse, sentiria vergonha pelos métodos crueis utilizados por seus pais? Saberiam que cada grão do café cultivado em suas terras foi regado com o sangue dos homens que vieram da África para alimentar o sistema monárquico brasileiro?
Não sendo Machado de Assis um homem de manifestações públicas e gritantes, teve ele a pena como forma de expressar sua indignação diante de uma situação opressora e desumana como a escravidão.
Poderíamos comparar sua luta com a do poeta Castro Alves? Não sei, cada um tem seus próprios méritos, Machado com sua ironia fina e sarcástica e Castro Alves com o ardor do abolicionismo em cada verso de cada poesia voltada à libertação dos escravos.
Neste dia 20 de novembro, no qual lembramos a luta de muitos homens e mulheres pela igualdade entre raças em solo brasileiro, temos que aprender com os escritores que usaram da palavra a maior arma para construir um país justo e humano, por isso deixaram grandes obras que vivem eternamente e podem servir para qualquer tempo, seja na explícita segregação do século XIX ou na velada forma de excluir dos nossos tempos.
Desta forma, damos continuidade a luta do líder Zumbi dos Palmares e de tantos outros que deram a vida pela causa da liberdade e da construção de uma sociedade que valoriza o ser humano pelo seu caráter e pelas sua boas ações, não pela cor da sua pele.

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Manuel Bandeira



Nascido no Recife em 19 de abril de 1886, Manuel Carneiro de Souza Bandeira Filho tinha como pais o engenheiro civil Manuel Carneiro de Souza e Francelina Ribeiro de Souza Bandeira. Quando Manuel tinha apenas quatro anos a família se mudou para o Rio de Janeiro, depois para São Paulo, para enfim, retornar ao Rio. No ano de 1892 a família Bandeira voltou para o Recife, onde o futuro poeta fez seus estudos primários.
Continuando os estudos, Manuel Bandeira bacharelou-se em Letras e, em 1903, matriculou-se na Escola Politécnica de São Paulo para fazer o curso de engenheiro-arquiteto. Nas férias do primeiro para o segundo ano ele adoeceu e teve que abandonar definitivamente os estudos. Durante seu tratamento de saúdo fez estações de cura em vários lugares do Brasil, como Minas Gerais, no Estado do Rio de Janeiro, Ceará, e por fim, viajou para a Suíça, onde permaneceu entre os anos de 1913 e 1914, tendo como companheiro de sanatório o poeta Paul Éluard. Regressando ao Rio de Janeiro, lançou em 1917 seu primeiro livro de poemas "A Cinza das Horas" . Em 1918 conhece Ribeiro Couto e, por meio deste, os escritores paulistas que em 1922 lançam o movimento modernista. A partir de 1925 começa a escrever para a imprensa, colaborando em várias revistas e jornais.
Trabalhou também em cargos ligados a educação e cultura do país, em 1935 foi nomeado inspetor de ensino secundário; em 1938, professor de Literatura Universal no Externato do Colégio Pedro II, em 1942, professor de Literaturas hispano-americanas na Faculdade Nacional de Filosofia, sendo aposentado por lei especial do Congresso em 1956. Desde o ano de 1938, Manuel Bandeira era membro do Conselho Consultivo do Departamento do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional.
Em 1940 é eleito membro da Academia Brasileira de Letras, e em 1942 membro da Sociedade Felipe d'Oliveira.
Manuel Bandeira recebeu vários prêmios por sua obra, entre eles o prêmio da Sociedade Felipe d'Oliveira em 1937 pelo conjunto da obra e o prêmio de poesia do Instituto Brasileiro de Educação e Cultura em 1940, também pelo conjunto da obra.
Sua posição na poesia brasileira é das mais importantes, sendo um dos pioneiros do Modernismo e o principal introdutor do movimento. Mário de Andrade o definiu como "o São João Batista do Modernismo".
O escritor faleceu no dia 13 de outubro de 1968 na cidade do Rio de Janeiro.
Algumas obras do autor:


Poesia:- A Cinza das Horas - Jornal do Comércio - Rio de Janeiro, 1917 (Edição do Autor)
- Carnaval - Rio de janeiro,1919 (Edição do Autor)
- Poesias (acrescida de O Ritmo Dissoluto) - Rio de Janeiro, 1924
- Libertinagem - Rio de Janeiro, 1930 (Edição do Autor)
- Estrela da Manhã - Rio de Janeiro, 1936 (Edição do Autor)
- Poesias Escolhidas - Rio de Janeiro, 1937
- Poesias Completas acrescida de Lira dos cinqüent'anos) - Rio de Janeiro, 1940 (Edição do Autor)
- Poemas Traduzidos - Rio de Janeiro, 1945
- Mafuá do Malungo - Barcelona, 1948 (Editor João Cabral de Melo Neto)
- Poesias Completas (com Belo Belo) - Rio de Janeiro, 1948
- Opus 10 - Niterói - 1952
- 50 Poemas Escolhidos pelo Autor - Rio de Janeiro, 1955
- Poesias completas (acrescidas de Opus 10) - Rio de Janeiro, 1955
- Poesia e prosa completa (acrescida de Estrela da Tarde), Rio de Janeiro, 1958
- Alumbramentos - Rio de Janeiro, 1960
- Estrela da Tarde - Rio de Janeiro, 1960
- Estrela a vida inteira, Rio de Janeiro, 1966 (edição em homenagem aos 80 anos do poeta).
- Manuel Bandeira - 50 poemas escolhidos pelo autor - Rio de Janeiro, 2006.

Prosa:- Crônicas da Província do Brasil - Rio de Janeiro, 1936
- Guia de Ouro Preto, Rio de Janeiro, 1938
- Noções de História das Literaturas - Rio de Janeiro, 1940
- Autoria das Cartas Chilenas - Rio de Janeiro, 1940
- Apresentação da Poesia Brasileira - Rio de Janeiro, 1946
- Literatura Hispano-Americana - Rio de Janeiro, 1949
- Gonçalves Dias, Biografia - Rio de Janeiro, 1952
- Itinerário de Pasárgada - Jornal de Letras, Rio de Janeiro, 1954
- De Poetas e de Poesia - Rio de Janeiro, 1954
- A Flauta de Papel - Rio de Janeiro, 1957
- Itinerário de Pasárgada - Livraria São José - Rio de Janeiro, 1957
- Prosa - Rio de Janeiro, 1958
- Andorinha, Andorinha - José Olympio - Rio de Janeiro, 1966
- Itinerário de Pasárgada - Editora do Autor - Rio de Janeiro, 1966
- Colóquio Unilateralmente Sentimental - Editora Record - RJ, 1968
- Seleta de Prosa - Nova Fronteira - RJ
- Berimbau e Outros Poemas - Nova Fronteira - RJ


Além de diversas antologias que incluem poesia e prosa.

domingo, 7 de novembro de 2010

Eugenia Grandet - Honoré de Balzac


Honoré de Balzac é muito popular pelo romance "A mulher de trinta anos", obra da qual surgiu o termo "balzaquiana" usado para designar as mulheres na faixa dos trinta anos. Porém, o próprio escritor entendia que este é seu romance mais fraco em termos de qualidade literária.
O "Escritor Fábrica" teve muitos méritos que não deixaram que um romance fraco lhe diminuísse o valor. Entre estes méritos, está o romance "Eugenia Grandet" .
O romance é datado de 1833 e apresenta a pequena cidade francesa de Saumur na qual os princípios da ascensão da burguesia eram vistos claramente na figura do Pai Grandet (ou Tio Grandet), velho tanoeiro abastado que, aproveitando-se da Revolução Francesa, uniu seus dinheiro ao dote da mulher para construir uma grande fortuna, que lhe trouxe o prestígio de ser o homem mais rico daquela região, um vitorioso na visão do novo mundo que surgira depois da Queda da Bastilha.
O Pai Grandet era um homem sovina, extremamente materialista e individualista, não se preocupava com luxos e ostentações, portanto, a pequena cidade era seu porto seguro, já que não propiciava tais gastos.
Tendo uma filha única, Eugenia, o Pai Grandet tinha grandes planos para a herdeira, que era disputada por dois representantes de famílias tradicionais do local, a família Cruchot e a família Des Grassins, que lutavam ávidamente pela mão da jovem Grandet.
Mas o Tio Grandet tinha um irmão que não seguia sua cartilha de contenção de gastos, era o Senhor Grandet de Paris, que tinha um filho único chamado Carlos. Depois de gastar seus bens e encontrar-se em dívidas, o Grandet que não se adaptava aos princípios capitalistas do trabalho e da manutenção das fortunas através dele, mandou o filho passar um tempo com o irmão de Saumur. Eugenia já não pensava mais em nuenhum pretendente de Saumur, pois foi tomada por uma paixão intensa pelo primo da capital, tão fino nos tratos e tão sensível nas palavras.
Quando Carlos tem que ir embora para as Índias Orientais para tentar salvar o nome do pai que acabara de se suicidar devido a falência, Eugenia resolve entregar-lhe todas as economias que o pai lhe entragara por ocasião de seus aniversários passados. Para agradecer Eugenia, o primo a beija no corredor da casa, pouco antes de partir e vai embora com a promessa de espera por parte da prima, que fica em situação difícil quando o pai avarento descobre o destino que ela deu para suas economias.
Muito romântico o enredo até este ponto não é? Mas o Romantismo dá lugar a uma visão muito realista e irônica dos fatos, quando Carlos volta das Índias casado com uma mulher que não ama, penas por interesse no dote, e manda uma carta para a prima do interior pedindo de volta o anel que lhe havia dado anos antes, como símbolo do sentimento que nascera entre os dois durante sua estadia na casa do tio.
Eugenia continua fiel ao seu amor pelo primo e, depois da morte do pai, casa-se com um dos antigos pretedentes para conformar a sociedade local. O casamento de Eugenia é outro ponto que diverge dos princípios românticos, pois se trata de uma união por conveniência e a noiva exige que o futuro marido não mantenha esperanças de consumar a relação.
O romance "Eugenia Grandet" faz com que o leitor se depare com personagens que expressam o pensamento de uma época, como o Pai Grandet, que guarda em si os princípios do materialsmo e do capitalismo trazidos pela Revolução Francesa, é ganancioso,o irmão do velho tanoeiro, o Senhor Grandet de Paris, homem que representa a falência do antigo sistema finaceiro baseado na aristocracia e na nobreza como fontes de sobrevivência; seu destino é a morte, pois no novo mundo quem não se adapta é eliminado da "livre concorrência" proposta.
Eugenia concentra em si as características da mulher na soceidade burguesa: jovem submissa ao pai, entrega-se aos encantos de um homem que tem características semelhantes a de um cavalheiro romântico e depois de uma decepção, arranja um casamento falso para contentar a socieade local. Seu primo Carlos, ao contrário do pai, consegue se adaptar ao pensamento pós-revolucionário, pois consegue recuperar a fortuna da família utilizando-se de um pouco de trabalho e de um grande dote de uma mulher sem qualquer atrativo sentimental.
Outra figura interessante do livro é a serviçal Nanon, que acompanha a família por toda a sua vida e é extremamente submissa aos princípios avarentos do patrão Grandet.
Não é a toa que Balzac é conhecido por seu enorme talento em criar personagens marcantes.



terça-feira, 2 de novembro de 2010

Dia de Finados

A morte é um tema interessante para a Literatura. Durante o auge do Romantismo, muitos poetas viviam na Terra esperando a morte que viria como fuga para a impotência sentida diante de um mundo tão cruel para pessoas sensíveis e sentimentalistas. Em tempos mais modernos, José Saramago humaniza a morte no romance "As intermitências da morte". É...todos ficam pasmos e não sabem o que fazer quando esta "indesejada das gentes" deixa de ceifar vidas. E depois, quando ela resolve avisar sua vinda através de uma temida carta? São situações que nos fazem refletir sobre o tema. Mas discutir sobre a morte é coisa que o ser humano faz desde que nasce. Seja de forma religiosa, social, física...a todos este assunto interessa, embora muitos não gostem nem de pronunciar esta palavra.
Manuel Bandeira escreveu um poema que descreve bem o feriado de 02 de novembro.
Poema de Finados
Amanhã que é dia dos mortos
Vai ao cemitério. Vai
E procura entre as sepulturas
A sepultura de meu pai.
Leva três rosas bem bonitas.
Ajoelha e reza uma oração.
Não pelo pai, mas pelo filho:
O filho tem mais precisão.
O que resta de mim na vida
É a amargura do que sofri.
Pois nada quero, nada espero.
E em verdade estou morto ali.
Os que estão já na última morada passaram pela morte física, seus corpos estarão lá eternamente, mas quantos continuam andando por esta Terra e estão mais mortos do que eles? O poema apresenta um pessimismo que pede que as orações de voltem para os vivos, pois eles têm mais necessidade, já que a amargura da vida os tornaram mais mortos do que as pessoas amadas sepultadas no cemitério. A perda de pessoas queridas causa esta amargura, e tantas outras razões para nos amargurarmos podem ser citadas!
Emily Dickinson escreveu um poema que também é bem pertinente ao dia de finados.
Cemitério
Este pó foram damas, cavalheiros,
rapazes e meninos;
Foi riso, foi espírito e suspiro,
Vestidos, tranças finas.
Este lugar foram jardins que abelhas
E flores alegraram.
Findo o verão, findava o seu destino...
E como estes, passaram.
Todas as pessoas que repousam nesta terra tiveram suas estórias, algumas mais longas, outras mais curtas, todas viveram e sofreram seus dramas, seus probelmas. Todas riram alguma vez na vida, quem sabe amaram e deixaram amantes chorando ao partirem. Mas todos um dia partem, isso é inevitável, por mais doloroso que seja para a nossa humanidade aceitar ser privada da presença física daqueles que amamos. Resta a cada um apegar-se a formas de viver estas perdas de um maneira menos traumática, pois as pessoas passam, mas as lembranças permanecem.